Nada sei sobre Bertold Brecht mas não sobreviveria como profissional sem seus ensinamentos. Sei que sou um analfabeto político, porém, a autocrítica já um bom começo para se dar um efetivo passo rumo ao enfrentamento das nossas limitações culturais. Sem mais nem porque foi a cobertura política que me atraiu, assim que desvencilhei-me da condição de editor internacional. Foi a minha estréia na redação de O Popular, após um desafiador teste de aptidão, sob o rigor e o sarcasmo do editor-chefe Wagner de Góes. O rigor foi fundamental para minha afirmação profissional e o sarcasmo foi imprescindível para que eu, psicologicamente, percebesse a segurança com que Wagner agia no sentido de obrigar-me a um constante processo de autocrítica, de humildade e de perseverança no embate diário contra minha insignificância em meio às “feras” do texto e do status profissional, habitantes exclusivos daquele privilegiado espaço: avenida Goiás, 345, 3º andar. Com que orgulho eu ali aportei, ao perceber estar ingressando na verdadeira faculdade do jornalismo! Indescritível a sensação, inesquecíveis as lições do dia-a-dia que avançava pela madrugada naquela catedral, digo, redação. Citar nomes daqueles a quem devo a gratidão por inúmeras razões é temeroso, mas vou arriscar, não para excluir os muitos a quem prestaria reverências, apenas por imperativo de consciência: a Hélio Rocha devo tudo pelo pouco que sei sobre texto, sobre o foco, sob a hierarquia dos fatos e sobre a alma dos fatos. A Walder de Góes (irmão de Wagner, meu primeiro mestre) devo a paixão pela cobertura política. Na sua irreverência de repórter de inteligência incomum me inspirei não para imitá-lo, mas para absorver suas lições. Políticos de todos os matizes acorriam à redação não para dar entrevistas, mas para conhecer o pensamento de Walder. Presenciei memoráveis encontros, quando Walder desmitificava com o verbo e sua ácida verve seu interlocutor, que dali saía despido na sua jactância mas agradecido pela aula maquiavélica. As gargalhadas do competente e professoral Haroldo de Brito, testemunha daqueles encontros, explicariam melhor o que tento dizer aqui. Além de ser o âncora de todos que o procuravam, Hélio se doava intelectualmente ainda mais: honrava a todos os focas com a sua boa companhia extra-redação, com hora para iniciar e sem hora para terminar. E tome madrugada de bons porres, primeiramente culturais e jornalísticos. Obrigado, Hélio Rocha. Obrigado, Domiciano de Faria. Suas ponderações e observações foram igualmente fundamentais.
Quando imaginava já ter visto e absorvido tudo no universo do jornalismo, outra vez fui brindado pelo vento benfazejo da sorte. Juntei-me à brava equipe pioneira do recém-nascido Diário da Manhã. Em outra oportunidade falarei do quanto evolui profissional e humanisticamente à sobra do visionário e revolucionário Batista Custódio.
Voltando a Bertold Brecht, só posso agradecer o fato de censurar os que se orgulham de não gostar de política. Gostar ou não é uma outra história. Lutar contra seus limites culturais para não ser mais um inocente útil é o que importa. Felizmente, ainda há tempo de se beber na fonte generosa de Brecht, cuja primeira lição é não se fartar na ignorância de dizer orgulhosamente “detesto política”. Todos devemos detestar não a política como instrumento de Poder, ou ferramenta de manipulação das massas, mas o que os políticos fazem e por que fazem para chegar ao Poder e como nos prejudicam quando não têm o discernimento de usar o Poder para o bem de todos e felicidade geral da sociedade a que pertencemos. Nós, como eleitores. Eles, como atores. Quanto mais se insiste em ignorar a política, mas correremos o risco de os atores confundirem joio e trigo. Por enquanto, há mais joio de que trigo. Isto porque, muitos de nós ainda não assimilamos tudo que Brecht quis nos ensinar. Se baixarmos a guarda, os vendilhões darão mais um passo à frente, nos relegando ao papel de ingênuos expectadores.
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