sábado, 14 de fevereiro de 2015
A reinvenção do governo que mira o futuro
No fragor da campanha eleitoral do ano passado uma manchete de jornal revelaria seu potencial demolidor de imagem, devido à riqueza de detalhes do contencioso envolvendo a Secretaria da Fazenda e o grupo Friboi. Como em política nada ocorre por acaso, percebeu-se logo que a informação abalaria os pilares de uma candidatura que se prenunciava forte. Ao retirar-se da disputa o pretenso candidato ao governo pelo PMDB, Júnior Friboi atribuiu o recuo à “sanha incontida” de Iris Rezende pelo poder. A alegação era um pretexto.
O fato de vir a público a grande dívida do grupo ao Estado pôs às claras o clima carregado da disputa eleitoral e acabou por provocar o apagão do candidato-alvo.
O discurso dele era todo centrado na falta de seriedade do governo. Sua proposta era instalar-se no cargo para inaugurar uma nova aurora de eficiência e moralidade. A bomba jornalística pulverizou uma proposta que se pretendia moralmente inexpugnável.
Com a aproximação do dia da eleição em segundo turno o que emissários de Júnior Friboi verbalizavam, em termos de simpatia pela candidatura Marconi Perillo, insinuava um processo de convergência de interesses difusos. Eles se evidenciariam depois, consagrando a máxima de que política e negócios são atividades interdependentes. Se Júnior Friboi não trabalhou ostensivamente pela vitória de Marconi, importa registrar que seu grupo empresarial fez doações à campanha tucana, fez críticas ao candidato do PMDB e jamais desautorizou seus seguidores de prosseguirem com prognósticos a favor da vitória de Marconi.
Aqueles fatos só ganharam nitidez quando outra manchete (Diário da Manhã) surgiu em torno do mesmo tema: a dívida do grupo, ou melhor, a monumental sonegação até então preservada do conhecimento público. A informação de que o grupo havia quitado uma dívida de R$ 1,3 bilhão que, com um generoso “deságio”, fora reduzida para R$ 320 milhões, jogou luz sobre os subterrâneos da campanha passada e ainda deve produzir consequências na campanha de 2018, caso haja reincidência em termos de aventura eleitoral.
As ilações são inevitáveis. Agora já se sabe por que uma candidatura fora abortada, as doações foram feitas e declarações de simpatia pela reeleição do tucano foram abundantes, além dos petardos dirigidos ao companheiro Iris Rezende. Aliás, naquela altura da campanha, companheiros já eram outros. Os que estenderam a mão a um pacto, que levariam a um entendimento em torno de dívidas fiscais e maneiras especiais de quitá-las.
No desdobramento da última manchete foram revelados os detalhes de um arranjo feito em tempo recorde e discrição máxima para que o alvo da bonomia oficial fosse contemplado. Os pormenores vieram a público reforçando ainda mais a convicção de argutos observadores de que não há almoço grátis em política. Todo o arranjo legal, revelado em artigo no Popular, se processou no vácuo de um singular momento, quando véspera de Natal, feriados alongados, pontos facultativos e fim de ano galvanizaram a atenção da sociedade, alheia ao que se passava na Assembleia Legislativa. A agilidade na tramitação e aprovação de um projeto de lei que ampliaria as facilidades do Programa de Incentivo à Regularização Fiscal de Empresas em Goiás foi o talhe perfeito para uma costura feita sob rigorosa medida. Enfim, consumou-se uma operação com todas as tintas de um negócio ideal. Por ideal entende-se um negócio em que ambas as partes saem ganhando. Feito um balanço da operação, vê-se que o arranjo reveste-se do verniz da legalidade, com a chancela legítima de um Parlamento atento ao interesse público. Afinal, o que se recolheu aos cofres públicos, ainda que seja uma pequena fração de uma grande dívida, fora imediatamente creditado à conta dos servidores estaduais que não mereciam a pena de ficar sem o salário de dezembro do ano passado. Quão fortes são as razões para que o Parlamento seja compreendido no seu espírito de solidariedade para com o funcionalismo! E quão tênue é a linha que separa o espírito público dos interesses privados!
Para o grupo Friboi foi um bom negócio, dos tantos que os grandes grupos fazem com os diversos governos e as mais variadas instituições de créditos. O exemplo vem de cima, pois é o BNDES o melhor parceiro de operações financeiras quando do outro lado do balcão está um grande grupo e que, para ostentar seu porte, converte-se também em grande doador de campanha eleitoral, sem discriminação partidária.
Não se pode dizer que não foi também um bom negócio para a outra parte. É fundamental perceber que operação de tamanho porte gera vantagens não só financeiras, mas também políticas. Estas, porém, exigem lentes especiais para serem detectadas. São vantagens que geram efeitos imediatos e conseqüências a longo prazo, tempo suficiente para que os resíduos de “entendimentos” celebrados em dias de feriados se diluem.
A notícia vinda à tona pode ser lida também como uma espécie de ultimato para o amanhã. Ela traz implícita a advertência àquele que está identificado no epicentro de operação. Uma nova disputa eleitoral pode ser um risco, tal a natureza controversa do negócio. E só é controverso porque deixou de ser segredo. E só deixou de ser segredo para se revelar como estratégia política fulminante: além de detonar candidatura no nascedouro vai desestimular seu recrudescimento futuro, pois surgiria contaminada pelo passado. A propósito: o segredo não é a alma do negócio? Quem ganha, quem perde, com as últimas revelações?
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